Numa perspectiva construtivista do ensino e da aprendizagem a competência disciplinar e a habilidade didática constituem um binômio em contínua interação com resultados variáveis.

Em outras palavras o domínio do conhecimento científico do ponto de vista heurístico-conceitual, experimental e formal.

A capacidade de proporcionar aos alunos as situações mais favoráveis para seu crescimento intelectual e emocional.

E de sustentá-los em seu processo de aprendizagem específica.

 A Competência Disciplinar

De um lado o domínio do conhecimento científico por parte do professor é importante para poder executar com sucesso as seguintes tarefas:

  • Reconhecer as variáveis relevantes e as relações significativas

Presentes na análise de um determinado fenômeno ou na solução de um determinado problema.

E ao mesmo tempo avaliar o grau de simplificação e de aproximação na solução do particular problema.

A localização e utilização das relações significativas entre as grandezas é essencial para poder tratar e compreender os fenômenos do ponto de vista disciplinar.

A consciência do grau de simplificação da representação adotada é fundamental para direcionar uma discussão rumo ao aprofundamento do conhecimento científico.

  • Compreender a diferença entre a estrutura lógica do conhecimento científico e a organização histórica de sua produção

A primeira constitui um produto acabado.

Aonde as ambiguidades e os conflitos foram, na medida do possível, resolvidos.

E os elementos se relacionam numa forma recursiva.

A segunda constitui um processo no qual os pontos essenciais são o aparecimento e a superação das rupturas e dos conflitos.

Numa situação de coexistência entre o conhecimento velho e o novo.

O domínio desta diferença é um instrumento indispensável para o monitoramento do processo de desenvolvimento do conhecimento dos estudantes.

Que apresenta características em boa parte semelhantes, rumo a apropriação final do conteúdo disciplinar

  • Distinguir as características

Do saber científico e do senso comum.

Sobretudo no que diz respeito a suas estruturas, a suas organização, a suas questões fundamentais, a seus objetivos e a seus valores.

De um lado o reconhecimento da estrutura do conhecimento científico é uma condição para a identificação dos pontos chaves a serem ensinados.

Permitindo que o professor possa persegui-los “online” durante a atividade didática.

De outro lado a aprendizagem estável de um conhecimento científico exige, por parte do estudante, uma mudança conceitual que não se limita aos conceitos e relações entre as grandezas.

Mas envolve, pelo menos em parte, também a ecologia e a cultura que sustenta a atividade científica.

Como valores, epistemologia, tipos de questões, maneiras de resolvê-las, etc.

Um passo importante rumo à mudança conceitual é fornecido pelo reconhecimento da inteligibilidade, da plausibilidade e da fertilidade do novo conhecimento.

O docente terá alcançado essa compreensão somente após ter elaborado um conjunto organizado de razões teóricas, experimentais e heurísticas a respeito dessa diferença.

  • Identificar as relações incompatíveis com o conhecimento disciplinar

Implícitas nas questões formuladas pelos estudante ou nas suas expressões de modo geral.

E caracterizar as situações e os contextos nos quais mais facilmente estas concepções são utilizadas.

Esta característica da competência do professor não costuma ser explicitamente considerada.

De fato nota-se que as questões, formuladas pelos professores ou pelos livros didáticos, procuram ser diretas, levando a respostas sem ambiguidades.

Não estimulando uma análise crítica com exploração mais ampla do problema.

Consequentemente a identificação de respostas ‘erradas’ dos estudantes não tem utilidade prática.

E a resolução dos problemas não exige uma grande competência disciplinar, por parte do professor.

Ao contrário, a formulação de questões suficientemente ambíguas para permitirem o aparecimento das concepções alternativas dos estudantes, mas analisadas com suficiente rigor para não fornecerem informações implícitas inadequadas, exige uma visão ampla e aprofundada dos detalhes do conteúdo disciplinar.

  • Produzir e/ou selecionar

Um conjunto de problemas, experimentos, textos e material pedagógicoadequado à promoção de conflitos cognitivos entre o conhecimento científico e o alternativo manifestado pelos estudantes.

A tarefa de promover e desenvolver conflitos cognitivos envolve de um lado o reconhecimento das contradições implícitas no discurso ou nas ações dos estudantes.

E de outro lado a escolha de atividades que tornem tais conflitos explícitos para os próprios estudantes.

  • Elaborar analogias, exemplos e imagens 

Que facilitem a apropriação do conhecimento científico por parte dos estudantes.

E simultaneamente estabeleçam uma ponte entre esse conhecimento e suas idéias espontâneas.

Tais pontes permitem de um lado diminuir a distância entre a situação inicial dos estudantes e a meta a ser alcançada.

E de outro lado permitem que o caminho dos estudantes possa ser articulados em etapas com conquistas provisórias, controladas de perto pela observação contínua (avaliação).

Posturas que dificultam a eficiência didática

No entanto, não podemos deixar de reconhecer que a grande familiaridade com o conhecimento científico leva, às vezes, a posturas que prejudicam a eficiência didática:

  • Subestimar as dificuldades que se apresentam aos estudantes que não possuem a mesma estrutura conceitual e a mesma cultura do professor.

Para este, as relações abstratas e gerais da ciência aparecem quase evidentes.

Porém tal evidência deriva do conjunto de informações, valores e métodos que sustentam a utilização das mesmas relações.

  • Ser incapaz de abandonar, durante o processo de ensino, o rigor das formulações e de trabalhar com conceituações provisórias e parciais, mais próximas do conhecimento dos estudantes.

O privilégio atribuído pelo professor ao conteúdo em detrimento de sua inteligibilidade parece derivar simultaneamente de uma concepção da aprendizagem como recepção passiva e da indiferenciação entre o processo de produção do conhecimento e seu resultado final.

Facilmente quem trabalha cotidianamente com a última versão do conhecimento esquece que anteriormente trabalhou-se com material científico mais grosseiro.

E, às vezes, com sérias limitações e contradições, que somente foram superadas com enorme esforço intelectual e que para isso levou-se um grande período de tempo.

 A Habilidade Didática

A habilidade didática pode ser expressa como a capacidade de executar com sucesso as seguintes tarefas:

  • Definir, pelo menos implicitamente, as metas específicas a serem atingidas em cada aula.

Tais metas, que consistem nas conquistas intelectuais e emocionais essenciais a serem alcançadas pelos estudantes.

Servirão como guia para orientar e programar ‘online’ as atividades didáticas.

Ao mesmo tempo em que elas próprias serão reavaliadas a partir dos resultados conseguidos.

  • Elaborar uma representação dos conhecimentos prévios dominados pelos estudantes, sejam eles espontâneos e científicos.

Tal representação, mesmo que qualitativa e superficial, deve incluir também indícios das possibilidades efetivas dos estudantes.

Tanto quanto ao aspecto cognitivo como ao afetivo.

A tensão entre esta representação e as metas a serem atingidas constitui a fonte de propostas didáticas continuamente diferentes, tornando-se o maior antídoto contra a rotina no trabalho do professor.

  • Planejar o desenvolvimento das aulas

Ou seja propor uma sequência a priori de atividades coerentes com a representação das capacidades dos estudantes e com as metas a serem atingidas.

Um dos pontos mais importantes dessa sequência será constituído pelas avaliações.

Produzidas seja para obter informações sobre o processo de aprendizagem dos estudantes, seja para definir o conhecimento por eles adquirido.

Este planejamento, que diz respeito a um conjunto significativo de aulas, deverá ser adaptado após cada uma delas.

Tendo presente as atividades efetivamente desenvolvidas e os resultados efetivamente alcançado.

  • Fazer com que os alunos deem a priori um significado favorável à experiência didática.

Isso pressupõe a antecipação de um esquema afetivo capaz de organizar significativamente o conjunto das atividades propostas.

Mesmo daquelas que o aluno não pode compreender completamente.

Sem esse sentido a priori dificilmente o processo de aprender continuará vivo e eficiente.

Tornando-se, ao contrário, uma rotina a ser executada com o mínimo de esforço, para o professor e também para o aluno.

  • Conduzir as aulas de maneira eficaz, adaptando, continuamente e ‘online’, o planejamento às respostas concretas dos estudantes.

Esta tarefa tem dois pontos essenciais.

De um lado reconhecer os sinais que os alunos fornecem ao longo das atividades.

Interpretando-os como informações sobre o significado por eles atribuídos a cada atividade e sobre o correspondente grau de envolvimento intelectual e emocional.

De outro lado propor ações que tenham sentido para os estudantes.

Ou seja que produzam uma ressonância quanto ao conteúdo cognitivo e ao modo de desenvolvimento.

Em outras palavras o objeto de discussão deve ter ligações fortes com o que os alunos já conhecem e o modo de condução deve constituir um progressivo desafio para os mesmos.

Também uma grande habilidade didática pode envolver perigos, tais como:

  • Manter as metas de aprendizagem sem modificações

Não se preocupando com renovar ou aprimorar seu conteúdo.

Pode ser resultado de uma grande segurança metodológica do professor.

A finalidade do ensino é aproximar o estudante do conhecimento científico continuamente reformulado e aumentado.

E a atuação do professor deve ser coerente com este propósito.

As metas devem ser avaliadas quanto a seu mérito em relação ao progresso do conhecimento científico.

E quanto à sua coerência em relação às possibilidades dos estudantes.

  • Produzir situações artificiais 

Que estão muito longe de se sustentarem sozinhas na ausência do professor.

Uma grande capacidade do professor em envolver os estudantes em atividades didáticas pode produzir situações de excitação intelectual e emocional.

Que têm como subproduto a incapacidade do estudante de auto promover seu próprio desenvolvimento.

Os alunos somente aprendem com aquele professor, não tendo desenvolvido a capacidade de aprender sozinhos ou em grupo, por sua própria iniciativa e com seu próprio controle.

professor

A competência do professor é uma soma bastante equilibrada de conhecimento específico da disciplina e do processo de aprendizagem.

Dentro da concepção de ensino que considera o estudante protagonista da sua aprendizagem e o professor organizador e orientador deste processo, o planejamento consequente e as avaliações devem ser tomados como instrumentos de promoção e de controle da aprendizagem.

Este papel está garantido quando o professor é capaz de apresentar em sala de aula comportamentos coerentes com uma interação dialógica contínua entre ele e seus estudantes:

  • Monitorar o progresso dos estudantes

Identificando os aspectos e/ou os elementos que se modificam.

Aproximando-se das metas desejadas, e aqueles que delas se afastam.

A complexidade da aprendizagem dos estudantes implica num longo caminho a percorrer.

No qual os resultados, as expressões e as considerações progressivas dos estudantes, quando analisadas cuidadosamente e rigorosamente, dificilmente são satisfatórias do ponto de vista científico.

Por isso é necessário identificar quais modificações nas concepções dos estudantes devem ser encorajadas.

Porque apresentam sinais de semelhança com o saber disciplinar, e quais, ao contrário, questionadas, por levarem longe dele.

De qualquer forma, tanto o reconhecimento quanto o encorajamento e o questionamento exigem uma grande capacidade de entrar em ressonância com os detalhes do conhecimento científico e de seu desenvolvimento histórico.

  • Interpretar o discurso e as ações dos estudantes

Isso significa, de um lado, que as expressões ‘erradas’ dos estudantes devem ser identificadas com suas concepções alternativas mais enraizadas.

E, de outro lado, que o significado por eles atribuídos a cada atividade bem como o correspondente grau de envolvimento intelectual e emocional devem ser identificados com sinais concretos.

  • Auxiliar os estudantes

A tomar consciência das modificações que ocorrem ao longo de seus processos de aprendizagem.

A percepção, por parte dos estudantes, tanto dos aspectos e/ou elementos de seu conhecimento que se modificam, aproximando-se ou afastando-se das metas institucionais.

Quanto das suas intenções, seus projetos e seu grau de satisfação, que se alteram, resultando numa maior ou menor identificação com as atividades didáticas.

Constitui um importante auxílio para uma genuína negociação sobre os rumos do trabalho escolar.

  • Promover discussões abertas e autênticas com os estudantes

Estimulando-os a levantar questões e a detetar e exprimir suas dúvidas e suas dificuldades.

Assim como a tomar decisões referentes a seu envolvimento intelectual nas tarefas escolares.

Esta prática exige um grande domínio do conteúdo disciplinar e uma grande sensibilidade por parte do professor,.

Que, para manter com sucesso o diálogo, deve perceber quais argumentos em favor do conhecimento científico são efetivamente convincente para os seus particulares alunos.