Você conhece tendências pedagógicas que norteiam o processo de ensino aprendizado?

Ou as concepções sócio filosóficas da educação?

Embora muita gente não perceba a relação, educação e filosofia andam juntas!

Educare significa nutrir, amamentar, cuidar; e educere é trazer para fora, modificar, tirar de.

Ou seja, educar é nutrir a saída de um estado para a entrada em outro.

Por sua vez, philos significa gostar, apreciar, amar algo; e sophia é sabedoria.

Assim, filosofar é dar expressão ao prazer de estabelecer sabedoria.

E é essa interface que conduz o raciocínio à apreciação de dar significado coerente e lógico para o processo educativo.

E que resulta no desenvolvimento integral do ser humano.

Dessa forma, é a partir dos questionamentos e das críticas levantados pela Filosofia que diferentes correntes sócio filosóficas fundamentam as distintas tendências pedagógicas estabelecidas.

As principais tendências pedagógicas são usualmente divididas em liberais e progressivas.

Mas, estes dois blocos ou eixos têm também subdivisões ou vertentes.

E é sobre isso o nosso post de hoje!

Comecemos então pelas tendências liberais que constituem as pedagogias não críticas da educação.

As Pedagogias Não-Críticas da Educação

Fundamentam-se em uma compreensão da sociedade como um todo orgânico e harmonioso, dentro do qual os indivíduos que destoam são marginalizados.

Para estas tendências pedagógicas, cabe a educação contribuir com a ordem e o equilíbrio e promover a coesão social.

Ela é considerada algo externo à sociedade, sendo esta, portanto, uma forma ingênua de perceber a educação (TURCHIELLO, 2017).

Tais pedagogias também entendem que as mentes das novas gerações devem ser formadas, a fim de dar continuidade à organização social, salvando-a.

Por este motivo, elas são classificadas como redentoras da sociedade.

Além disso, as pedagogias não-críticas difundem a ideia de igualdade de oportunidades, mas não levam em conta a desigualdade de condições.

Afinal, as mesmas estão vinculadas ao sistema capitalista enquanto teoria política e econômica, o qual tem como suas principais premissas: o Estado mínimo, a Lei da Oferta e da Procura, a defesa da propriedade privada dos meios de produção e a estimulação do comércio e da indústria.

Além de reconhecer disso, tais premissas têm causado super exploração dos recursos naturais e destruição dos habitats naturais e das espécies biológicas.

Assim como sabemos que não existe desenvolvimento da produção capitalista sem desigualdade social.

Logo, o que é denominado redenção da sociedade na verdade é altamente questionável.

Estas tendências liberais, tem como vertentes a pedagogia tradicional, pedagogia renovada ou escola nova – progressivista ou não-diretiva e a pedagogia tecnicista.

Para os liberais, a educação e o saber já produzidos (conteúdos) são mais importantes que a experiência vivida pelos alunos no processo de aprendizagem.

Dessa forma, os liberais, contribuíram para manter o saber como instrumento de poder entre dominador e dominado (Queiroz, 2007).

E o resultado disto é a formação de profissionais acríticos sem potencial para a transformação da sociedade.

Tendência Liberal Tradicional ou Pedagogia Tradicional

Tem por finalidade preparar os alunos para a sociedade.

Dentro disto, esta tendência considera que o caminho para o saber é o mesmo para todos os alunos, que precisam se esforçar para alcançá-lo.

Os conteúdos são acumulados por gerações e repassados para os alunos como verdades.

Mesmo que não façam parte da realidade do aluno e da sociedade em que a escola se encontra inserida.

O método é baseado na exposição verbal e/ou demonstração.

E o professor exige atitude receptiva dos alunos para com este método de ensino.

Assim, o professor, é figura incontestável, o único detentor do saber que deve ser repassado para os alunos.

E os alunos são geralmente, considerados como um papel em branco (tábula rasa), sem opinião ou personalidade própria, nos quais o conhecimento deve ser impresso.

Nessa perspectiva, cabe aos alunos, portanto, concordar com tudo que lhes é ensinado sem questionar.

Por isso, os conhecimentos adquiridos fora da escola não são considerados importantes para a construção de saberes.

E os problemas sociais pertencem à sociedade e não à escola.

Para esta tendência, a capacidade de assimilação da criança é considerada semelhante à do adulto.

Então, a progressão dos conteúdos é definida por adultos, sem levar muito em conta as necessidades típicas de cada fase da criança (e muito menos dos indivíduos).

A aprendizagem é receptiva e mecânica e a retenção feita por repetição e por recapitulação.

Trata-se de um ensino enciclopédico, ou seja, voltado à memorização de diversas informações.

Assim, as avaliações, exercícios e interrogatórios são voltados a reforçar e conferir a reprodução de conteúdos.

Sendo esta reforçada positivamente com boas notas por exemplo.

Essa é a tendência predominante no Brasil, tanto no ensino fundamental e médio quanto no ensino superior, que vive uma salada de concepções pedagógicas.

Assim como em muitos outros países ocidentais, tendo origem principalmente das ideias de John Locke.

Esse tipo de pedagogia é na verdade a causa de dificuldades de aprendizagem, repetência, evasão, bullying, exclusão, entre outros problemas educacionais da atualidade.

Além disso, sabemos que os professores são fruto da sua formação escolar, social e política, e que esta reflete na sua prática pedagógica quando a mesma não é pensada/refletida cotidianamente.

E assim, temos um ciclo vicioso: formado sem reflexão, formo alunos sem reflexão, também.

Pedagogia Renovada ou Escola Nova

Defende a formação do indivíduo como ser livre, ativo e social, sendo o aluno o centro da relação professor-aluno.

O professor é um facilitador do ensino e o aluno é indivíduo único, diferenciado, que vive e interage em um mundo dinâmico.

Assim o aluno deve ter sua curiosidade, criatividade e individualidade estimulados pelo professor.

Nesta tendência a aprendizagem é um processo interno e deve acontece por descoberta, experimentação e construção do conhecimento.

E muitas vezes os professores falham por não organizar seu trabalho, achando que os alunos é que devem conduzir o processo.

O foco do trabalho deve ser mantido na qualidade e não na quantidade, no processo e não no produto.

Tem duas ramificações: a progressivista e a não-diretiva.

Tendência Liberal Renovada Progressivista

Nesta tendência o ensino acontece progressivamente por meio de experiências que satisfaçam os interesses do aluno e as exigências sociais.

Ou seja, é dado mais valor ao desenvolvimento de processos mentais e cognitivos do que aos conteúdos propriamente (deve-se “aprender a aprender” e/ou “aprender-fazendo”).

São empregadas tentativas experimentais, pesquisa, descoberta e solução de problemas, de acordo com as necessidades do aluno e etapas do seu desenvolvimento.

As escolas que aplicam desta tendência são chamadas escolas ativas (ou escola novistas), pois trabalham com vivências dinâmicas do meio natural e social e o método de resolução de problemas.

O professor nesta perspectiva auxilia o desenvolvimento livre e espontâneo da criança e intervém para dar forma ao raciocínio dela.

Na aprendizagem, é retido o que se incorpora por descoberta pessoal à estrutura cognitiva do aluno e que terá utilidade para a vida dele.

Autores brasileiros da área da Educação, como Anísio Teixeira e outros, escreveram o documento Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932), o qual teve influência até mesmo sobre a criação da LDB.

Tendência Liberal Renovada não-Diretiva

É voltada para a autorrealização e menos preocupada com questões sociais e pedagógicas.

Não pensa em disciplina rígida como um pressuposto para a aprendizagem, mas sim na espontaneidade.

Assim, prioriza ao invés do intelecto, o sentimento e ao invés da lógica, a psicologia.

Nesta tendência o professor não está no centro do processo, mas sim o aluno.

Não há imposição do conteúdo, mas escolha dos conteúdos pelos alunos.

É centrada na formação de atitudes e na mudança dentro do indivíduo, que deve estar bem consigo mesmo e com seus semelhantes.

Procura facilitar aos alunos os meios de buscar por si mesmos os conhecimentos necessários para sua autorrealização.

Para tanto, a escola deve oferecer um clima favorável para que ocorra a mudança dentro do indivíduo.

O professor deve desenvolver um estilo próprio, de um “facilitador” que ajude o aluno a auto organizar, o aceitando como ele é.

Assim, o professor se ausenta, em determinadas etapas do processo de aprendizagem, por respeito e aceitação da capacidade de auto-organização do aluno.

A motivação do aluno é um ato interno, sendo a aprendizagem um processo de modificação das percepções.

Por isso, espera-se apenas a retenção do que é importante para o aluno e, portanto, a avaliação acontece por autoavaliação.

O inspirador deste processo é Carl Rogers e um exemplo de sua prática é a da escola de Summerhill de A. Neill (Inglaterra).

Nesta escola existem 180 normas, mas todas criadas em assembleias, nas quais cada criança e cada adulto tem igual direito de voto.

Pedagogia Liberal Tecnicista

Esta pedagogia prioriza a educação para preparar mão-de-obra, com ênfase na Tecnologia.

Nessa tendência cabe a escola aperfeiçoar o sistema capitalista, articulando-se com o sistema produtivo.

Utiliza a ciência da mudança do comportamento, visando produzir indivíduos “competentes” para o mercado de trabalho.

Assim, é “adestradora” ou modeladora do comportamento humano.

A matéria de ensino é apenas objetiva, com informações precisas e rápidas contidas no material instrucional.

Esta pedagogia elimina toda subjetividade do processo de aprendizagem.

E faz uso de tecnologia educacional estruturada por passos sequenciais, como módulos, por exemplo.

O professor funciona como “fantoche” executor do processo, ditado por especialistas supostamente habilitados, neutros e imparciais.

Assim, o professor é um elo entre a verdade científica e o aluno, que deve ser responsivo apenas às instruções.

O aluno não é ensinado a pensar, pelo contrário, deve receber o que lhe é dito sem questionar.

O foco é formar um indivíduo mecânico, racional e operacional, dirigido para o mercado de trabalho nas empresas de tecnologia.

Por isso, nas aulas não há debates, nem espaço para relações afetivas e pessoais.

O ensino se dá por reforço positivo das respostas que se quer obter e por controle do desenvolvimento individual face a objetivos pré-estabelecidos.

A avaliação é, portanto, baseada em objetivos instrucionais operacionalizados em comportamentos observáveis e mensuráveis.

Skinner e seus conceitos de comportamento operante e estímulo reforçador são importantes influências.

Essa tendência foi introduzida no Brasil nos anos 60, por interesse do regime militar.

As Teorias Crítico-Reprodutivistas e as Tendências Críticas da Educação

As teorias crítico-reprodutivistas da educação compreendem a sociedade a partir da divisão de classes, com interesses diferentes, sendo a marginalidade produzida pela estrutura social.

Para essas teorias, a educação não é redentora, mas reprodutora da sociedade, tendo como função mantê-la, já que faz parte da mesma.

Um pressuposto básico desta abordagem é que toda sociedade para se perpetuar tem que se reproduzir.

Então, para haver a reprodução das condições materiais de produção é preciso haver a força de trabalho, a qual tem duas vertentes – uma biológica e outra cultural.

A sustentação da multiplicação biológica da força de trabalho é sustentada pelo salário, fruto do sistema de produção capitalista.

Mas, a força de trabalho tem que ser também competente, precisando ser reproduzida desde o ponto de vista qualitativo (cultural).

Ou seja, torna-se necessária a formação profissional, segundo os diversos níveis e necessidades da divisão social do trabalho (Luckesi, 1994).

Assim, esta formação se dá de duas maneiras principais: por aprendizagem de saberes práticos, como ler, escrever, contar e elementos de cultura científica e literária utilizáveis; e ensinando regras de “bons costumes”, segundo o lugar a se ocupar na sociedade.

Desta forma, há reproduções da submissão (dos proletários) e da capacidade para manejar bem (para os agentes da exploração e da repressão), segundo determinados moldes que asseguram a sujeição à ideologia dominante.

As tendências críticas da educação também consideram que existem diferentes interesses das classes sociais.

Elas entendem que o processo educacional faz parte da sociedade e não é redentor, nem salvador, mas, um meio para a mesma realizar seu projeto.

Tais abordagens têm uma posição otimista com relação à educação e desejam superar as pedagogias tradicional e renovadora.

Pretendem também eliminar as dicotomias que existem entre trabalho intelectual e trabalho manual, teoria e prática, dando condições às classes populares de se emanciparem.

As principais tendências críticas são: a Pedagogia Libertadora, Pedagogia Libertária e Pedagogia Crítico-Social dos Conteúdos.

Pedagogia Libertadora ou Tendência Progressista Libertadora

Foi bastante divulgada por Paulo Freire.

Está presente principalmente no ensino não-formal, mas muitos professores aplicam alguns de seus pressupostos no ensino escolar.

Critica as relações do homem com a natureza e os outros homens, visando transformá-la.

Para isso faz uso de conteúdos extraídos da prática de vida dos alunos, nunca de fora, por “invasão cultural”.

Nesta tendência, o mais importante é despertar uma nova forma de viver a experiência e não os conteúdos em si.

Seu método do diálogo engaja os sujeitos, professor-aluno, e o professor não trabalha para o aluno, mas com o aluno.

Os alunos em grupos de discussão autogerem a aprendizagem e, dentro deles, o professor é um mediador, que pode, no entanto, fornecer informações mais sistematizadas aos alunos.

A avaliação acontece no âmbito da prática vivenciada entre professor e aluno no processo de grupo.

E também por autoavaliação em termos de compromissos individuais assumidos para com o grupo e seus objetivos.

Há uma relação horizontal, onde todos estão aprendendo e a ação do professor é não-diretiva, mas ele não se ausenta (como em Carl Rogers).

A problematização de aspectos da realidade é a motivação da aprendizagem.

E aprender é ato de conhecer a realidade concreta vivida, através de um processo de compreensão, reflexão e crítica.

Pedagogia ou tendência Libertária

Pretende ser uma forma de resistência à burocracia e à ação dominadora do Estado.

Trabalha o sentido de autogestão nos alunos para a participação em mecanismos institucionais de mudança (assembleias, conselhos, associações, etc).

Por isso as matérias são colocadas à disposição, mas não são exigidas.

Os conteúdos resultam das experiências vividas pelo grupo, a partir da investigação cognitiva do real.

A vivência grupal, por iniciativa do próprio grupo, sem qualquer forma de poder, é seu método.

O progresso da autonomia dos alunos vai crescendo progressivamente.

Começa por contato de aberturas informais, segue por organização do grupo (com diversas formas de participação e expressão) e então há a execução.

A relação professor-aluno é não-diretiva e, dentro dela, o professor estimula, dinamiza e se mistura com o grupo.

A aprendizagem é informal e o interesse em crescer dentro do grupo é autônoma.

Assim, a escola deve, para esta tendência, romper com as barreiras que a tornam um mecanismo que delimita o ensino, o conhecimento e o saber, fazendo dela um privilégio dos que conseguem alcançá-la e nela permanecer e/ou avançar.

Tudo o que é experimentado deve se tornar incorporado e utilizável para ser apreendido, o que não tem um limite ou um ponto onde precise terminar na vida.

A pessoa é para sempre aprendiz, esteja ela na função de professor em determinado momento ou de aluno.

Sendo assim, não há tentativas de avaliação.

Essa tendência é aplicada como pedagogia anarquista e alguns autores importantes são: Cèlestin Freinet, Francisco Ferrer y Guardia, Aida Vasquez e Fernand Oury.

Pedagogia Crítico-Social dos Conteúdos

Aborda conteúdos escolares, mas não de maneira desvinculada da realidade dos sujeitos.

A escola faz parte do todo social e agir dentro dela também transforma a sociedade.

Os conteúdos culturais universais são reavaliados face às realidades sociais e devem estar ligados à sua significação humana e social.

Assim, de uma experiência imediata e desorganizada de mundo, passa-se a uma experiência sintética e organizada, com intervenção do professor.

Deste modo, pretende-se dar acesso aos conteúdos, mas de maneira a ultrapassar estereótipos e condicionamentos.

O trabalho docente relaciona a prática vivida pelos alunos com os conteúdos propostos.

Assim, uma aula começa com constatação da realidade pelos alunos, em seguida há a interação com os conteúdos propostos e então a síntese.

O professor busca despertar necessidades no aluno de acreditar nas suas possibilidades de ir mais longe, incentivando sua participação ativa.

Baseia-se na aprendizagem significativa, sendo que ele precisa verificar aquilo que o aluno já sabe antes de oferecer-lhe algo novo.

O aluno tem que compreender o que o professor está querendo dizer.

A aprendizagem se dá por síntese e a avaliação deve comprovar para o aluno seu progresso (e não apenas para o professor).